Sempre
que uma menina conta uma história de abuso sexual contra ela é porque este caso
aconteceu de fato. A afirmação é da professora Marilu Menezes, pedagoga e
mestre em Educação, que atua na Fundação Luterana de Diaconia (FLD) e trabalha
com a temática do abuso sexual contra crianças e adolescentes em escolas de todo o país. “É
importante acreditar sempre na criança que faz a denúncia”, disse Marilu, que
participou na última segunda-feira (04/06) à noite, na Escola Municipal Emilio
Meyer, bairro Medianeira (região Cruzeiro), da Jornada Municipal de
Enfrentamento à Violência, ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e
Adolescentes. O evento é promovido pela Comissão de Defesa do Consumidor,
Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) da Câmara Municipal de Porto
Alegre.
Durante o debate sobre o assunto,
o momento de emoção foi reservado ao depoimento espontâneo de uma jovem de 21
anos, que confessou publicamente ter sido vítima de abuso sexual quando tinha 5
anos de idade. Outras pessoas presentes também relataram terem tido
conhecimento de casos de abuso sexual contra e apontaram as dificuldades para
se denunciar os abusadores.
Para Marilu Menezes, a coragem das
vítimas de abusos em falar sobre o problema é muito importante na medida em que
ajuda a romper o silêncio sobre o assunto e encoraja as pessoas a denunciarem
outros casos. Citando o recente episódio em que a apresentadora Xuxa Meneghel
confessou, em entrevista a um programa de TV, ter sido vítima de abuso sexual
na infância, Marilu observou que a primeira reação de boa parte do público foi
a de julgar Xuxa pela exposição pública, sob a alegação de que ela queria
ganhar espaço na mídia. “No dia seguinte à entrevista de Xuxa, no entanto, o
tema do abuso sexual contra crianças e adolescentes estava sendo discutido em
todo o país”, diz a professora. “Com esta atitude (falar sobre o abuso), a Xuxa
pode mudar a sua própria história.”
Escolas
Marilu Menezes trabalhou na
coordenação pedagógica com crianças vítimas de abuso sexual. Ela destaca a
importância dos profissionais que trabalham com o tema mostrarem que é possível
superar a violência. “O abuso sexual contra crianças e adolescentes é a
violência mais silenciada no país. Não se tem ideia precisa do seu tamanho.
Quanto mais informações as pessoas tiverem sobre o assunto, mais fácil de
identificar os casos.”
Ela citou o exemplo de uma escola
da Paraíba em que professores e alunos trabalham a temática do abuso sexual
durante um mês inteiro. “Os professores foram desafiados a pensar em como falar
sobre esse tema com crianças muito pequenas, de até 6 anos de idade. É preciso
se avaliar se as escolas abrem espaço para que as crianças falem sobre o
tema.”, disse Marilu.
O delegado de polícia Adalberto
Mattos, que tem trabalhado com casos de violência contra a criança na Delegacia
de Polícia para Crianças e Adolescentes (Deca), lembra que todas as crianças e
adolescentes na faixa etária entre zero e 18 anos incompletos estão sob o
resguardo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) no Brasil. Ele ressalta
a importância dos pais terem controle sobre o uso da Internet por parte das
crianças e observou que, atualmente, a existência de arquivos de fotos com
cenas de sexo explicito com crianças e adolescentes, em um computador de
qualquer pessoa, pode ser suficiente para servir de prova contra o pedófilo ou
abusador e configurar crime.
Desta forma, informa Mattos,
também é considerado “estupro de vulnerável” o caso em que uma pessoa tiver
relação sexual com uma criança menor de 14 anos. Ele ressalta que a legislação
também protege os meninos vítimas de abuso sexual e alerta para a importância
de se ter cuidado na divulgação de informações pessoais por meio das redes
sociais ou em chats com pessoas estranhas na internet. “Nessas situações, o
usuário pode liberar informações para um pedófilo ou um abusador.”
18 de Maio
Nascida em 2 de julho de 1964, em
Vitória (ES), Aracelli Cabrera Sanches Crespo foi assassinada violentamente em
18 de maio de 1973, aos 8 anos de idade. Seu corpo foi encontrado somente seis
dias depois, desfigurado e com marcas de abuso sexual. Vinte e sete anos
depois, a data de sua morte foi transformada no Dia Nacional de Combate ao
Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes pelo Congresso Nacional.
Na cidade de Serra (ES), vizinha à
cidade de Vitória, a ausência de Aracelli foi notada pelo pai, quando a menina
não voltou para casa depois da escola. O corpo da menina foi encontrado seis
dias depois nos fundos do Hospital Infantil de Vitória (Hospital Jesus
Menino). Os suspeitos do crime eram pessoas ligadas a duas famílias ricas
do Espírito Santo e conhecidos na cidade como usuários de drogas que violentavam
meninas. Apesar de serem os principais suspeitos e de haver testemunhas contra
eles, os dois acusados jamais foram condenados pela morte da Aracelli. De
acordo com o relato de José Louzeiro, autor do livro Aracelli, Meu Amor,
o caso produziu 14 mortes, desde possíveis testemunhas até pessoas interessadas
em desvendar o crime, que repercutiu em todo Brasil.
A ideia de se celebrar o Dia
Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes
surgiu em 1998, quando cerca de 80 entidades públicas e privadas reuniram-se na
Bahia. Desde a sanção da Lei N° 9.970, em 17 de maio de 2000, entidades que
atuam em Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes promovem
atividades em todo o país para conscientizar a sociedade e as autoridades sobre
a gravidade dos crimes de violência sexual cometidos contra crianças e
adolescentes.
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